Avanços recentes do setor não trouxeram valorização da categoria

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Capítulo 8 Especial #Afagro20anos

Na história recente dos fiscais estaduais agropecuários, há diversos fatos a serem destacados. Um deles é a evolução do status sanitário em razão da retirada da vacina contra a febre aftosa, avanço que ocorreu em 2020 fruto de um trabalho de mais de 20 anos da categoria em conjunto com as cadeias interessadas, desde os últimos focos da doença registrados em Joia. Na área vegetal, destaca-se o controle da deriva de agrotóxicos como o 2,4-D por meio da identificação do problema e regulamentação da aplicação de produtos hormonais. Estes são dois exemplos dos feitos da fiscalização agropecuária gaúcha na atualidade.

“É um trabalho que foi se edificando e se estruturando com o passar dos anos. Apesar da precarização das condições de trabalho, a capacidade do serviço foi se consolidando”, define o fiscal estadual agropecuário Richard Alves, presidente da Afagro, ao olhar para trás e avaliar a construção que vem sendo feita pelos servidores. Na pandemia, os trabalhadores da Secretaria da Agricultura (Seapi) permaneceram atuando presencialmente por serem atividade essencial, embora isto ainda não tenha sido reconhecido pelo Estado, na prática, por meio da valorização da categoria.

Na avaliação do dirigente, a capacidade desenvolvida para a erradicação da febre aftosa, por exemplo, contribuiu para o controle de outras enfermidades, como a doença de Newcastle, doença de Aujeszky e própria influenza aviária. Da mesma forma, o conhecimento adquirido pelos fiscais engenheiros agrônomos com episódios como a deriva do 2,4-D também contribuem para futuras experiências com situações que ainda não foram vivenciadas, como é o caso do greening – doença do citrus presente em Santa Catarina, Uruguai e Argentina.

“A legislação estadual dos agrotóxicos hormonais que a Seapi publicou é única no País. Nenhum outro estado tem algo tão robusto e específico para os produtos hormonais. Somos referência em artigos sobre o tema”, detalha a engenheira agrônoma Michelle Rodrigues, fiscal estadual agropecuária de Dom Pedrito. No final de 2017, a servidora protagonizou a descoberta de casos de deriva do 2,4-D em cultivos sensíveis como a uva na região da Campanha.

Dois anos mais tarde, no final de 2019, na época da greve contra o parcelamento e atraso dos salários, eram altos os índices de notificação de deriva no Estado. “A aplicação do agrotóxico foi suspensa no Rio Grande do Sul por recomendação do Ministério Público. A liberação do uso do produto ficou condicionado ao final da greve dos fiscais”, recorda Michelle.

Michelle atendendo denúncia de deriva (Foto: Jean Pierre Martins Machado)

Redução do número de inspetorias

O avanço do status sanitário trouxe benefícios para a economia do Estado, como a valorização do rebanho e a melhoria nas condições de exportação. Contudo, esta evolução também trouxe algumas mudanças, como a redução do número de inspetorias de defesa agropecuária para atender algumas exigências de ordem mais burocrática do Ministério da Agricultura (Mapa). Isto porque, na época, havia municípios sem médicos veterinários – ainda não havia sido realizado novo concurso público.

A separação da área animal e vegetal, que antes estavam sob um mesmo guarda-chuva, possibilitando a execução do trabalho com maior foco na saúde única, também impactou na capacidade da fiscalização agropecuária. Em 2021, o decreto nº 55.984, publicado dia 8 de julho, alterou a estrutura básica da Seapi, criando o Departamento de Vigilância e Defesa Sanitária Animal e o Departamento de Defesa Vegetal. “O serviço é único. Esta separação enfraquece a qualidade do trabalho”, afirma Alves.

Perda constante de talentos

Na sequência desta reestruturação, o governo do Estado realizou concurso público com vagas para diversos cargos, inclusive para fiscal estadual agropecuário. A prova ocorreu em 2022 e, no mesmo ano, foram publicadas as nomeações. Porém, em razão da falta de valorização dos servidores, muitos assumiram e não ficaram por muito tempo na atividade.

Neste mesmo período, cresceu o número de colegas mais antigos que estão abandonando a função porque foram aprovados em outros certames. A perda de direitos nos últimos governos, que adotaram práticas como atraso e parcelamento dos salários, além de não conceder a reposição da inflação, também figura entre os motivos, além da falta de reconhecimento e remuneração adequada.

Relembre o caso de Joia

Alguns anos antes do evento sanitário em Joia, em 2000, a Secretaria da Agricultura havia demitido diversos extranumerários. Eram tempos de uma política de desmonte do serviço público, semelhante ao que ocorre atualmente. O concurso mais recente havia sido realizado em 1996 e as condições de trabalho estavam bastante precárias.

João Luiz Ferrari em Joia (Arquivo pessoal)

“A febre aftosa impediu o desmantelamento do serviço e abriu as portas para novos concursos”, relembra o médico veterinário João Luiz Ferrari, um dos colegas que vivenciou o caso de Joia. O técnico lembra que os animais eram contidos pelos técnicos sem o uso de luvas e que somente alguns veterinários tinham botas e macacão.

Na foto, ele e alguns colegas aparecem caminhando entre os animais sacrificados na vala. O objetivo era colocar um bovino ao lado do outro para caber mais animais e também coletar material biológico para análise. Ferrari lembra que os veterinários que trabalhavam nas valas não iam para a cidade almoçar. Recebiam um lanche para comer no local de trabalho.

O médico veterinário Henrrison Serafini, que atua em Joia, foi um dos contratados após o evento sanitário. Começou a trabalhar no município em 2003, ano de fundação da Afagro, por meio de contrato emergencial e fez o concurso em 2005. No ano seguinte, ingressou no Estado como servidor concursado. “Na época foi bem difícil, pois não tinha nada informatizado, era tudo em papel”, lembra Serafini.

Analisando estas duas décadas de trabalho, o servidor constata que a demanda cresceu significativamente. “O compromisso e a responsabilidade aumentaram muito”, avalia Serafini.

Henrrison Serafini atua na inspetoria de defesa agropecuária de Joia desde 2003, ano de fundação da Afagro (Arquivo pessoal)

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